Sou consciente. Sou consciente de que pouco me lembro, de todos os meus anos de vida. Falam-me que fiz coisas maravilhosas que mudaram vidas. Dizem-me que fui jovem, belo, que todos me olhavam com orgulho e que viam em mim juventude e frescura. Mas os anos levaram-ma toda e deixaram-me com as minhas rugas. Já não olham para mim com orgulho, mas com pena. Já não sou fresco, como o verão, agora sou branco e frágil, como o inverno.
Contam-me que amei profundamente. Que ela era a minha vida e a minha paixão. Por minha tristeza, não me lembro. Será que não a amei o suficiente? Dizem que o amor verdadeiro nunca se esquece. Mostram-me fotografias em que sorria, abraçava e sentia. Não me vejo nelas. Por vezes esqueço-me de quem sou. Não me conheço muito bem. E quem me conhece, fala-me sobre uma pessoa que me é estranha. Tento encaixar-me no meio da sociedade, mas as pessoas vêem-me como um ponto, e pior, fazem-me sentir como um ponto ou uma mancha.
Gostava de amar, de sorrir e conversar. De ter planos, amigos e recordações. Sou uma certeza, de que vou ser assim até ao resto da minha vida. Entristece-me saber que para mim, eu nasci há pouco tempo, não tive uma infância ou adolescência, e que não terei. Sou uma dúvida. Será que amanhã, toda a minha vida me voltará à cabeça? Será que aquele belo jovem das fotografias tornar-se-á em mim? Sou realista. Acredito que todos nascem, já nasci, é das poucas memórias, ou melhor, dos poucos episódio que eu me lembro.
Brinquei num parque com areia e pedras.
Todos crescem, no meu dedo vejo uma marca circular em branco, e sei que lá esteve uma aliança. E todos morrem, disso não me lembro, sei que não aconteceu. Não temo por isso, pelo contrário, vai dar-me uma oportunidade de renascer, e viver, e lembrar.
Tenho pessoas que se preocupam comigo, que me olham com amor e carinho. Mas eu não as conheço. Para mim, elas são como qualquer outra pela que eu passe na rua. Choram, de alegria por me verem, pai e marido, e de tristeza por eu as ver, com indiferença. Trazem-me grandes discos de vinil, dizem que eram as minhas músicas preferidas, e que querem que eu me sinta
Batem à porta. É o filho. Diz que é meu filho, mas eu sei que não. Não é o meu filho, mas o do homem das fotografias. Abraça-me, beija-me, chora. Eu olho para ele, espero que ele se vá, que me deixe sozinho, que não me faça sentir mal por esquecer. O telefone toca. É a nora. Pergunta por mim, se eu tomo os medicamentos, deseja-me as melhoras, desliga. Ele muito fala, conta-me a história da minha vida. As minhas casas, a minha família. Vai-se embora.
Pelas portas ouço gritos de agonia, gritos de tristeza e raiva. É a mulher. Traz-me flores, e bolos, e roupa. Ama-me mais do que tudo no mundo. Conversa comigo, ao meu lado. Não gosto de a ver, por que ela sai sempre desiludida ao ver a minha indiferença, o meu interesse nulo. Diz-me que eu lhe cantava e que dançávamos, mas é--me igual.
Vão-se embora, estou finalmente a sós. Sento-me na cadeira. Fico a dormir, à espera de não acordar em mim, mas num novo eu.
Consegues que as lágrimas espreitem nos meus olhos...tenho tanto orgulho em ti minha pipoquinha!! Adoro-te mais do que tudo!
ResponderEliminarPipoquinha linda, como te disse ontem, está simplesmente, nota 10!Além de muito bem escrito, estás mais uma vez de parabéns no desenrolar e imaginar da ideia! Beijos grandes da tua madrinha, tia, amiga, whatever que te Adora muito!
ResponderEliminarA forma como escreves, a maneira como estruturas o texto, o vocabulário sempre certeiro, sem uma palavra a mais ou a menos, revelam que tu és e serás, certamente, uma enorme escritora!! Muitos parabéns por mais este texto magnífico!! Beijos enormes do teu pai que muito se orgulha de ti!!
ResponderEliminarTenhas a bravura de não te calar.
ResponderEliminarTenham a coragem de te ouvir
Sempre
És uma Luz*:)
O teu nível de escrita já está superior ao de qualquer bazaroco universitário. Acredita!
ResponderEliminarEstá mto giro mesmo! Consegues fazer com que as pessoas que lêem os teus textos se ponham na situação do relato! É umas ensação engraçada! Escreves mto bem!
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